domingo, 28 de junho de 2015

No Combate Do Amor, Eu Perdi.

"Meu amor, o que encontras
em teu poço fechado?
Algas, pântanos, rochas?
O que vês, de olhos cegos,
rancorosa e ferida?"


Quando a conheci, ela tinha olhos distantes e eu tive medo de deixar que se aproximasse, afinal de contas eu estava fechado pro mundo - coisa que ela não sabia - e tinha uma barreira muito grande entre os sentimentos e mim. E havia um poeira no meu coração, vestígios de uma casquinha que se criou por ali há um tempo atrás. E havia muito receio em deixar as pessoas entrarem na minha vida porque eu sei, eu sempre sei que o abandono existe e que a desistência vem. Mas a voz era tão suave e o sotaque tão inocente que eu quis me despir de tudo.
Depois de a conhecer, vi seus olhos ficando doces. Me olhavam, lindos!, bem no fundo, sem desviar nunca. A qualquer momento do dia, lá estavam aqueles olhos me olhando, fosse na imaginação ou ali, bem na minha frente. E eu os beijava tanto! Eu beijava os dois, porque se beijasse só um, o outro sentiria ciúmes.
E quantas vezes, pela tarde ou pela noite, eu decorei teu rosto com as minhas mãos? Quantas vezes eu ensaiei o desenho da tua boca, do teu nariz e queixo? E tu me perguntavas o que eu estava fazendo, e eu, paciente, dizia que nada, era só um carinho. Mas eu não complementava a frase com um “... pra nunca esquecer os traços do teu rosto lindo”.
Quando que a gente começa a gostar de alguém? O que se pode chamar de paixão? Eu não sou apaixonado. A paixão é muito rasa, fútil, egocêntrica. Eu gostava muito daquele cheirinho que ela tinha bem na voltinha da nuca e, por isso, gravei também teu cheiro.
Lembro bem de um dia escrever um texto pra ela - que nunca terminei, nem o mostrei - enquanto ela dormia bem ao meu lado. Dividir a cama se tornou algo ansiado a semana inteira pra alguém tão egoísta e espaçoso como eu. E eu a olhei lá, com a boca entreaberta, os olhos cerrados, os cabelos jogados e a respiração que eu adorava ouvir ali, bem perto de mim. E eu pensei: preciso escrever e cravar essa vivencia com ela o quanto antes, porque tudo é efêmero e morre. Eu pensava isso querendo acreditar no eterno, num infinito nosso.

"Não acharás, amor,
no poço em que cais
o que na altura guardo para ti:
um ramo de jasmins todo orvalhado,
um beijo mais profundo que esse abismo."


Bastaram poucos dias pra aquele olhar lindo e terno, um olhar poético mesmo, passar a ser um olhar cansado. Meu Deus!, o meu amor com os olhos cansados. De quê? Não sei. De mim? Talvez. E os olhos cansados resolveram abortar o que tínhamos, que ainda era tão pequenino e prematuro, que nem era muito, mas que eu cuidava pra um dia ser. E aqueles olhos não quiseram mais me ver. E, Deus!, como eu amava o jeito como me olhava antes. E, Deus!, como me doeu lá dentro, como se alguém espremesse muito meu coração, causando uma falta de ar e de amor dentro de mim. E eu pensava: qual foi o meu erro dessa vez? E já não achava resposta, então cansei de perguntar.
Eu decorei o rosto, o gosto e o cheiro. Conheci seu jeito e consenti com ele, pois eu a achava perfeita pra mim. Feita pra mim. O meu gostar por ela era tão bonito e único que eu acho que estava guardado ali especialmente para dedicar à ela. Era uma coisinha que eu nunca havia sentido e, sinceramente? Não quero voltar a sentir mais. Não por ser ruim, longe disso! Mas sim por ser bom demais e aí depois vai embora, assim, me deixando com um monte de gostar aqui dentro de mim que eu vou ter que ir expirando até acabar todinho, porque não se tem mais nada a fazer além disso, deixar o tempo, esse mercúrio cromo, tentar me salvar.
De volta à estaca zero: aqui estou eu, homem feito, frio, com medo das pessoas, com o coração - que foi chamado de instável - com uma casquinha de machucado que não sei quando vai sair, ou se quer sair.


Não era paixão, eramos nós!


"Não me temas, não caias
de novo em teu rancor.
Sacode a minha palavra que te veio ferir
e deixa que ela voe pela janela aberta.
Ela voltará a ferir-me
sem que tu a dirijas,
porque foi carregada com um instante duro

e esse instante será desarmado em meu peito."

Um comentário:

Anônimo disse...

Não deixe o medo de amar mudar seu trajeto natural de vida, perderás segundo a segundo pensando na tua casquinha. Por de baixo dela, coisa linda, essa ferida poderá sarar amanhã quanto não sarar nunca. E a vida é tão rara pra se desistir do sentimento, sensação, emoção que nos trás a conclusão de que viver vale a pena!
De volta a estaca zero: O que passou não merece mais de 1/4 da sua atenção, memória pura não existe sem as alterações que nossa própria mente a faz. Nada é tão horrível ou fantástico quanto nossa memória sugere. Eu estive ao seu lado e você não estava lá, você não viu. E eu também te observei dormindo, decorei sob flashs os olhares que me davas e jamais esquecerei os traços desse seu rosto lindo. Perfeita pra mim...
Ou seria.