quinta-feira, 26 de novembro de 2015

What Am I To You?

Para ler ouvindo: https://www.youtube.com/watch?v=C_C23JCduok

Elisa, há quanto tempo não te encontrava nessa vida. Ainda te lembro com as pernas pro alto, lendo o livro e fumando o cigarro, depois brincando com a fumaça que soltava. Eu não imaginava, Elisa, que tu irias brincar assim comigo também.

 I was talking to you
and I knew then it would be
a life long thing

Lembro de cada flor na saia e de cada fio desgrenhado do cabelo alisado, um pouco enrolado, amarrado bem no alto da cabeça e de como gostava de ficar assim, olhando o mundo de cabeça pra baixo pra dizer que as coisas estavam todas no lugar, porque o certo mesmo é pisar em nuvens e tentar tocar um céu duro, que nunca cai. O chão dando a sensação de infinito. Lembro de cada ideia, Elisa, cada absurdo de ideia que falavas enquanto nem me conhecias. Eu, ainda ali com meus trinta anos, meio maduro demais, meio judiado demais, meio curtido demais tipo um whisky. E tu ali, nos teu vinte e quase nada, nadinha mesmo, olhando as folhas meio verdes, meio amarelas se esgotarem com o tempo e desistirem, acabando caindo em cima de ti.

Aprendi muito cedo que por amor não se sofre, Elisa. Paixão, sim. Paixão até dá pra dar uns tragos em alguma bebida barata, se afundar em uns botecos, sair sem rumo, andando meio de lado e mal sabendo o número da casa. Mas por amor, não. Eu já bebi demais nessa vida, e me perdi no caminho pra casa várias vezes, mas quando chegou a vez de te perder pros mundo eu criei um espaço tão grande de esperança bem aqui dentro, no meu cérebro miúdo, e talvez tenha também esvaziado algumas garrafas e fumado alguns cigarros na ideia de te esquecer um pouco, ou de ter coragem de apagar tudo. Percebi que pra certas coisas eu não sou covarde, não!

Perder pro mundo, mas quem não sabia? Um dia uma moça me parou e pediu pra ler a minha mão, eu não entendo nada dessas coisas e ela foi logo pegando e dizendo: vejo uma moça de olhos cansados, vai te dar um mundo de sonhos... e eu fiquei esperando mais e ela disse: dez reais e vejo mais coisas. Logo abri a carteira e entreguei. A moça disse: vão ser felizes mas parece que não vai... já esteve mais.... E foi aí que eu desisti. Talvez ali tivesse sabido sobre o nosso futuro, porque aqueles olhos eram teus, e disso eu não tenho dúvidas.

Signo de ar, quantas vezes me avisaram: cuidado, vai logo se dispersar. Cuidado, não prende muito. Cuidado, não gosta de cobrança. Mas eu não sou de me policiar, nem muito cuidadoso Elisa, eu sou só um cara perdido por aí, inseguro que só, talvez intenso em algumas partes e aí eu te assustei ou te entediei. Mas me desculpa, Elisa, eu só queria te proteger e concretizar aquele mundo de sonhos que eu lembro que tu tinhas um caderninho onde escrevias e desenhavas coisas que querias fazer. Uma sala branca, um quadro pintado pela pequena, eu lembro exatamente, Elisa. Só não gostava do amarelo. Eu sou terra com água, perigoso demais misturar essas coisas com ar e mais todos os meus psicotrópicos, não é?

Elisa, meus dedos não cansam de te escrever. Teus dentes, teu colo e até quando reinavas comigo por algo que nem existia. Mas lembro que escrevestes coisas pra mim também, entre poemas, canções, cartas e bilhetes em papeis amarelinhos. As vezes penso que gostavas de mim. Nós poderíamos escrever um livro com a nossa história e faltaria palavras pra mostrar o quanto foi e é bonito dentro de mim, talvez em outra parte, não sei. Pode ser ali no pulmão, ou no coração. Talvez entre eles junte um vermelho e azul formando uma cor púrpura bonita pra se pensar nessa história, eu não me lembro muito das aulas de Biologia.

Esses dias, Elisa, eu bebi tanto que fui parar numa ponte. Uma ponte velha que tem por aqui. Imagina você que a ponte estava interditada porque uma moça pulou de lá, Elisa? Que vida de má sorte, porque falar azar só chama coisa ruim, e de ruim já basta o resto. Mas mesmo com o resto eu tenho agradecido, não sei pra quem, acho que a mim mesmo por aguentar essas coisas, e a moça que se jogou da ponte também. Se não fosse ela, eu teria atravessado aquela ponte toda, inteira, só pra ver qual a sensação de desafiar a vida. Talvez eu cansasse no meio do caminho e, vai saber? Ponte não é poço, né? Poço é onde eu tô agora, tentando ser puxado pra fora, mas tem tanta pedra nesse meu pé que tá osso, viu? Tá osso conseguir escalar as paredes até alcançar a mão de alguém.

Meus olhos não cansam de te lembrar, nem minha alma de te escutar, Elisa, mas a gente divergiu e pra ti não era pra ser, e pra mim era o início sendo escrito, mesmo que em linhas tortas, pra se tornar algo muito raro e bonito. Era uma “coisa” mais que possível, mas a escolha foi feita. Então eu fico aqui, saudoso, mas não apaixonado. E sem sofrer. Nunca deixe de sorrir, Elisa. E nem de sentir.


Com carinho e saudade.

I don't, didn't think
we'd end up like
like this


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