quarta-feira, 14 de maio de 2014

Destinatário: Um Doce

"Vai ficar por quanto tempo?


E era assim: eu, na cama, jogada - vezes nua, vezes com algum calcinha ou pijama. Ela não tinha vontade de me acordar, tamanha era a birra que eu faria. A maioria das vezes eu acordava sozinha e ela ou estava me olhando incansavelmente, esperando que eu logo abrisse os olhos e a enchesse de beijos (o que era bastante costumeiro) e cafunés, ou me acompanhava nos sonhos, ou - e o que era mais lindo vê-la fazendo - eu logo ao abrir os olhos, assim, devagar, a imagem embaçada e a procurando e mirando, quieta, porque adorava o corpo nu vezes na cadeira, oras deitada de bruços na cama, mas nunca largando os papéis e a nanquim. Contempla-la ali - minha, tão minha! E ela não percebia, concentrada nos desenhos. Então eu me mexia um pouco e ela me olhava e ia na minha direção me dar um beijo de bom dia. E sorria um sorriso bobo e perguntava há quanto tempo eu havia acordado e estava a observando. Eu não sabia responder porque perdia a noção de hora, tempo..

Certo dia parei pra pensar o que, exatamente, eu gostava tanto nela. Primeiro me vieram os olhos, mas isso era muito óbvio porque uma multidão deve achar eles lindos e sinceros. Parece que me engolem e aí eu morro de vergonha, mas já olhei um bocado pra eles - e pretendo olhar muito mais. Pensei no tanto que ela pensa e sente bonito as coisas, as pessoas. Uma forma leve, suave, que eu poderia conversar e concordar com aquilo por horas. Mas foi então que eu lembrei de tres coisas as quais eu mais gostava nela, comigo: o jeito em que me segurava quando me beijava, a adoração por não usar roupas, e quando ela pegou a minha mão pela primeira vez - e ainda não largou. Eram coisas simples e nossas. 

Mais simples ainda, entre nós, era o fato da linguagem. Ela disse: temos um dicionário só nosso. Acabei rindo um pouco, porque era até estranho o tanto que nos entendíamos assim, na aleatoriedade das duas. Pensei em uma terceira pessoa nos ouvindo conversar. Metade mensagem com os olhos e bochechas coradas, a outra palavras jogadas em vários assuntos e iam e vinham e iam e vinham. Mudávamos e voltávamos de assunto. Mas os silêncios não me deixavam agoniada, porque aí eu a olhava.

Um dia eu cheguei a pensar em usar a palavra amor. Forte, né? Eu pensei: Sempre que estou na presença dela, acabo não querendo estar em nenhum espaço de tempo que não fosse o presente. As vezes acho que - e foi aí que encaixei a palavra amor sem querer - o amor é isso. Era como se o coração dela fosse uma casa pra mim. E deu medo de pensar nisso, não aquele medo ruim, mas aquele medo quase infantil de gostar tanto, mas tanto, que no final eu ficaria sem as cenas matinais. 

Aliás, quando pode ela dorme até depois do meio dia.

Preparo um café, ou preparo a minha vida?"

Um comentário:

Luis Gustavo Brito Dias disse...

"o jeito em que me segurava quando me beijava, a adoração por não usar roupas, e quando ela pegou a minha mão pela primeira vez - e ainda não largou. Eram coisas simples e nossas".

- pode preparar a vida, SEM DÚVIDA!

PS: quanto aos signos de água, eu os compreendo bem porque também sou um signo de água.