quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Nos Escuro Não Se Faz Amor

"Houve um tempo em que tive um rio por dentro, mas acabou secando."

Acabo de me abaixar e encontrar um livro perdido de Clarice. Não tão perdido, visto que o achei. Se a bagunça, se o lodo já está de fora pra dentro nessas situações, imagine de dentro pra fora.
Estive por meses e estações confuso, procurando qual o exato erro em mim que não te permitia ficar comigo. Após sóis, chuvas e geadas veio o balde de água fria: a pergunta era inversa. O que em ti não me permitia te aceitar. Meu corpo te expurgava a cada vez que eu tentava me aproximar. Os astros mostravam no mapa que havia algo errado. Mas eu, ousando até me chamar de burro, pensava que todo o problema me envolvia. E envolvia.
Um dia tu me trocaste por um mais novo. Que grande besteira sofrer por aquilo! Era carnaval, todo mundo se ama no carnaval. Todo mundo se beija no carnaval. Eu mesmo, saí na rua, bebi, beijei uma morena, meio índia, com olhos expressamente puxados e com tatuagens pelos braços. Beijei um rapaz. Tu sabes, eu sou moderno e era carnaval. E tu fizestes segredo dos teus, destes um passo a mais e eu fiquei pra trás. Creio que a partir dali deixamos de ser um casal, para sermos martírio.
Voltastes pros meus braços. Nos beijamos e até quase nos amamos. Já estávamos em um grau de intimidade - com tão pouco tempo - que não nos importávamos com o bafo matinal, com a ressaca moral ou com o que os outros pensaram sobre tanto desleixo em dançar com pilares. Nossa história estava longe do fim, o outono acabara de começar. 
Nesse meio tempo eu parei e voltei a beber. Parei e voltei a fumar. Emagreci, engordei. Li seis livros e nenhum contava a nossa história. Quem diria? Porque nenhuma história era a nossa. Porque não havia história.
Tu dizias, frequentemente, pra que eu parasse os remédios, que já sabias me amar do jeito que eu era. Mais uma vez, enquanto eu era duro, tu me deste amor. Eu recusei. Na verdade tu mal te conheces, quem dirá à mim, quem dirá ao próximo? E o amor? Quem dirá... Tem gente que tenta ser remédio, e acaba sendo veneno.
Ontem mesmo, enquanto me escondias algo, eu fiquei com a tal bendita pulga atrás da orelha. Sempre digo: quem procura acha. Mas eu nem precisei procurar. Ele não tem meus olhos, não tem meus dons, não tem os meus cabelos. Ele não tem meu sorriso, não tem meu corpo, não te os meus dedos e nem a minha boca. Longe está de ter a minha idade. A única coisa, e tão insignificante e dolorido que deve ser pra ti, é o fato de ele ter meu nome. Ao menos tu nunca irás errar, mas jamais esquecer.
Erro fatal do destino me aproximar de ti. 
O inverno chegou e eu amor-nei.
Essa noite sonhei que Iemanjá me acordava. Era uma praia imensa e ela saia desnuda das ondas. Eu estava um ciente inconsciente. Meio dopado, meio drogado, um tanto bebado ainda. Todo o pó tinha me cansado muito. Ela vinha até mim e me beijava na testa, com seios fartos e, o que tinha de vestes era bonita, de um prata azulado. Os cabelos longos e negros. Eu despertava, levantava e seguia andando.
Algumas coisas a gente tem que ir deixando pra trás. - Tudo continua uma bagunça, porque tu não fizeste questão de arrumar, tu foste uma mulher como tantas outras, achadas em qualquer esquina, esbarradas em qualquer boteco, que gargalha por fora e chora por dentro. Que não tem parada, que não faz morada. Que seduz e bota fora porque não sabe lidar com o amor. - Tu foste uma delas.


 "Eu tinha esperança que o rio voltasse a encher um dia."


9 comentários:

Anônimo disse...

Aqui já não cabem mais palavras, Bibi... Respirei e inspirei cada uma delas! Muito lindo tudo isso que vc consegue escrever. Que assim continuem a fluir os seus pensamentos pra nos presentear
Linda!

Anônimo disse...

Li três vezes e morri quatro. Bonito. Pena que eu nunca vi isso acontecendo bem na minha frente, todo esse tempo sem saber. Só supondo.

Julianna Motter disse...

Bom voltar aqui :)

Anônimo disse...

Sobre os seus remédios, agora quem quer que vc pare com eles sou eu... E me enxergue, ou deixe de me ver de vez

Anônimo disse...

Oi, textos da bi... Que vcs cresçam cada vez mais em quantidade... E quanto à srta princesa, não cabe aqui o que quero dizer.

Bianca B. disse...



A moça ali dos remédios: não tem como te enxergar sendo anônima.

E pras outras moças: obrigada!

E pra Ju: sempre bom te ter de volta.

Anônimo disse...

Não venha aqui agradecer, apenas continue a escrever de forma como nunca vi. Sua linda!

Anônimo disse...

"Essa semana tem. Tem sim. Quero ver se começo a escrever ao menos uma vez por semana." Um passarinho veio me dizer estas palavras, ó

aluah disse...

que dom lindo tens!


(odeio provar que não sou um robô)


(ainda que talvez seja)